O SindiproesP, por suas diretoras Márcia Semer (presidente), Ana Arruda (tesoureira), Regina Pedrotti ( Diretora Adjunta de Assuntos Culturais e Sociais), Claudia Bocardi (Conselheira Fiscal) e Shirley Tomé ( Conselheira Fiscal), participou da audiência pública que a OAB/SP realizou em seu grande auditório, na tarde de 23/03, para discutir a Reforma da Previdência. Da Advocacia Pública estadual, ainda, o presidente da Apesp, Marcos Nusdeo, a Conselheira Seccional da OAB Raquel Barbosa e a ex-Conselheira da PGE Kelly Venâncio, todos filiados do SindiproesP, completaram o time de colegas que se envolveram nessa atividade.
A Casa estava cheia para ouvir as considerações dos diversos palestrantes sobre o tema que afeta toda a sociedade brasileira.
De se louvar a iniciativa da OAB/SP que, nesse e em outros temas polêmicos e de repercussão nacional, têm promovido essas audiências públicas e, com isso, promovido democratização do espaço de discussão das grandes questões da agenda política, de inequívoca interface com o direito.
A diretora Márcia Semer (presidente) fez uso da palavra para por em questão a necessidade da reforma da previdência, os impactos econômicos da reforma proposta e a constitucionalidade do modelo de capitalização.
Embora a pauta de reforma da previdência apareça como um mantra ou um dogma nos debates nacionais, é preciso, preliminarmente, por em questão sua real necessidade. Isto porque, a propaganda governamental e midiática diária dos últimos dois anos nitidamente visa incutir na sociedade o pânico moral, vale dizer, a convicção, baseada em palavras de ordem desprovidas de prova que as acompanhe e intimidatórias, de que ou se faz a reforma da previdência ou se instala o caos. Mas, será que isso é verdade?
Bom, pensando com nossa própria cabeça, no lugar de pegar o que sai da cabeça do governo e da boca da grande imprensa, parece que a coisa não é bem assim. Afinal, desde 1994, em razão do enorme superávit dos recursos da seguridade social, os sucessivos governos usaram em torno de 20% dos recursos dessa seguridade social para outros fins. Primeiro, foi o FSE (Fundo Social de Emergência), criado no governo Fernando Henrique (1994); e depois, ainda no governo Fernando Henrique (2000), o FSE teve o nome alterado para DRU (Desvinculação de Receita da União), que é o mecanismo existente até hoje. E tanto é fato que a seguridade social é superavitária, que no governo Michel Temer houve elevação da DRU (do percentual de desvinculação) de 20% para 30%, ou seja, 30% do dinheiro da previdência foi retirado do caixa para uso em outras coisas. Ora, se está faltando recursos, como se explica ampliar essa retirada de recursos de onde não tem?
Todos os dados oficiais indicam que a previdência social estrito senso foi superavitária até 2015 e que a seguridade social segue superavitária. Se é assim, dá pra confiar no discurso de que a reforma é matar ou morrer? Parece que não.
Os reflexos econômicos da reforma proposta são outro tema que precisa ser discutido. A PEC 06/19 propõe, grosso modo, empobrecer a todos. Reduz drasticamente os direitos previdenciários tanto pela ampliação da idade para aposentar (62M e 65H), como do tempo para aposentar (40 anos de contribuição), como dos valores percebidos (que caem para todos os extratos, inclusive para aposentados e pensionistas, com destaque para o desmonte do setor público). Obviamente, todo esse movimento de empobrecimento da sociedade impactará a economia com forte redução do poder de consumo interno dos brasileiros. Não precisa ser economista nem matemático pra entender isso e nós, advogados, podemos enxergar com alguma facilidade esse cenário. Então, mais uma vez questionamos: pra quê confiar numa proposta de reforma da previdência que prejudica o povo e o país?
Por fim, falamos da questão da constitucionalidade do modelo de capitalização, que nos parece bastante discutível. É nosso ponto de vista, e foi isso que expusemos na OAB/SP, que o sistema de capitalização é incompatível com os fundamentos e objetivos da Constituição, resultando caminho inconstitucional, não passível de implementação generalizada. Constituem fundamento da República Federativa do Brasil os valores sociais do trabalho (art. 1º, IV) e objetivo da República a construção de sociedade solidária (art. 3º, I). O sistema de capitalização não encarna nem o conceito de valor social do trabalho nem o de solidariedade social, ao contrário, é a antítese desses primados. Em 1988 o país promulgou uma Constituição, a Constituição Cidadã, cujas balizas não são enfeites. Evidentemente que o espectro de políticas públicas possíveis e que se encaixam no modelo constitucional é bastante amplo, mas não é ilimitado, não cabe qualquer coisa. E, embora a reforma da previdência se faça pela via constitucional, essa via não pode infirmar os pilares centrais das escolhas político-jurídicas chanceladas em 1988 para guiar o país.
O filiado Marcos Nusdeo, que também é presidente da Apesp, também fez uso da palavra e pontuou, entre outros, o aspecto mais perverso e perigoso da proposta que é a desconstitucionalização dos direitos e garantias da Previdência Social.
Entre todos os que se manifestaram o olhar crítico sobre a PEC 06/19 foi consenso, não tendo havido, naquele ambiente, nenhuma voz que tenha endossado a proposta tal qual apresentada.